Depois de uma pequena pausa, volto a publicar uma entrevista com meus leitores. Já tinham até me puxado a orelha e perguntado quando iria publicar uma nova entrevista! Desta vez, lhes apresento um casal “café com leite”, que eu já tive a oportunidade de conhecer ao vivo e do qual gostei de cara: Má e Rô. É uma entrevista longa, mas cujo conteúdo é super diversificado e muitíssimo interessante, inclusive com um projeto comunitário relacionado ao Brasil. Vale a pena ler! Curtam comigo!
– Façam uma curta apresentação de vocês por vocês mesmos.
Somos o famoso casal “café-com-leite”. Isso mesmo, uma paulistana com um mineiro de Belo Horizonte. Eu por mim mesma: Maira Engelmann, paulistana, 30 anos (depois da entrevista s o “tempômetro” rodou pra 3.1), formada em Engenharia Química, mestranda em MBA Marketing Internacional na Universidade de Reutlingen (Alemanha), apaixonada pela vida, pelo Brasil e pelo marido. Meu marido por mim: Rodrigo Luis de Gouvea, 32 anos, formado em Engenharia Mecânica (sim, família engenhoca), funcionário da MAHLE em Stuttgart (Alemanha), apaixonado por viagens, pelo Brasil e (eu sei que sim) por mim.
– Como surgiu a oportunidade de vocês virem morar na Alemanha?
Após alguns anos trabalhando na empresa alemã MAHLE no Brasil (SP), meu marido foi convidado para trabalhar na matriz em Stuttgart. Quando ele me disse sobre a possibilidade não hesitei em “jogar tudo pro alto” (emprego, independência financeira e etc), pois enxerguei na oportunidade dele, uma oportunidade para mim também, uma vez que qualquer experiência fora do nosso país é sempre enriquecedora e sempre uma oportunidade pra redirecionar o leme da nossa vida.
– Seu blog chama a atenção pelas alto astral, pelas fotos lindas e pelo nome criativo. Como tem sido a experiência de escrever um blog longe de casa?
Sinceramente, sem o blog tudo seria bem mais difícil e muito menos divertido. Quando decidi vir para a Alemanha acompanhando meu marido, comecei a pensar em todas as possibilidades do mundo para que eu não “esmorecece”, principalmente porque a primeira vez que vim para cá foi justamente no inverno. Conversando com uma grande amiga que tem um blog, descobri nesse canal de comunicação virtual um caminho e foi então que começou a história do “Retratos e Relatos”. Ele “nasceu” em 2006 e só tem me dado alegrias desde então, pois através dele conheci muita gente especial (inclusive a Mineirinha) que tem me ajudado muito a manter a inspiração e a paixão por relatar algumas das experiências que estamos vivendo desde que chegamos aqui. Enfim, o que começou como uma forma de “contato” com familiares e amigos do Brasil, se tornou uma forma de conhecer e ajudar brasileiros no mundo todo.
– Qual é o lugar predileto de vocês, depois de tantas viagens? Cite o link dele para as fotos do seu blog.
O melhor lugar do mundo é aquele onde a gente se sente em casa, ou seja, aquele lugar onde você se sente integrado, se identificando com a cultura e se sentindo à vontade com o povo local. Dentro dessa minha definição eu citaria não um lugar, mas vários lugares onde nos sentimos, por motivos variados, em casa: Brasil (SP, MG, RJ e Fernando de Noronha), Transilvânia (Romênia), Escócia (Europa), Quênia (África), Annecy (Franca), Viena (Áustria), Berlim (Alemanha), Amsterdam (Holanda), Dolomiten (Itália) e Roma (Itália). Mas ainda essa semana estamos indo para a Noruega e acredito, depois das fotos que vimos, que entrará com certeza para esta lista. Aqui nesse link tem um índice que direciona para cada viagem. Pra quem quiser se inspirar, é só navegar.
– O seu sobrenome tem muita pinta de alemão. Qual é sua ascendência?
Pinta? Ele é totalmente e lindamente alemão. Pois é, quando morava no Brasil era um problema, mas sempre fui apaixonada pelo meu sobrenome e até por isso o mantive mesmo depois de casada. Minha bisavó era alemã. Aliás, acho que meus problemas com alemães começaram com minha bisavó, pois, segundo minha mãe e minha avó, nós brigávamos muito. Enfim, acho que já estava planejado pra mim ter que me adaptar à cultura alemã e, após quase 3 anos por aqui, acredito que estou cumprindo bem meu “carma”. (((-:
– Como foi a experiência de tentar uma vaga de mestrado na Alemanha? Conte um pouquinho do “empurrãozinho” da Mineirinha. 🙂
Quando cheguei na Alemanha só tinha uma certeza: precisava estabelecer metas. O pontapé inicial foi, lógico, aprender a língua alemã e logo depois já comecei desesperadamente a buscar um curso de pós-graduação. Tentei um na minha área de formação (Engenharia Química), mas não fui aceita graças à Deus, pois foi uma tentativa totalmente impulsiva e desesperada por algo que eu, de verdade, nao queria. Depois decidi me preparar melhor para tentar algum mestrado em alemão mesmo, ou seja, precisava conseguir uma boa nota no TestDaf. Após um ano de curso intensivo de alemão, fiquei mais meio ano estudando sozinha em casa e me preparando para o teste. Durante esse tempo fiquei fazendo listas do que eu gosto e do que eu não gosto, pra tentar traçar minhas novas metas e, de repente, em meio a uma crise existencial, uma amiga minha me indicou o mestrado que estou cursando atualmente. Foi então que minha vontade aumentou e ganhei mais forças para conseguir passar no teste de proficiência em alemao. Logo na primeira prova já tirei notas boas e que, no final, foram suficientes para garantir minha chance pela vaga no mestrado. Mas o TestDaf era só um detalhe dentro de todo o processo de seleção. Precisei apresentar meus diplomas e históricos traduzidos e autenticados do ginásio e da universidade, meu currículo, uma carta de apresentação e ainda participar de uma entrevista em inglês e alemão com dois entrevistadores. A Mineirinha me ajudou muito a adequar meu currículo e minha carta de apresentação aos moldes alemães, pois esse processo é muito importante, uma vez que estes documentos sao responsáveis pela “primeira impressão”, logo são eles que irão definir se você será ou não chamado para a próxima e mais difícil etapa: a entrevista. Para o alemão é preciso objetividade e quem não domina muito bem uma língua tem muita dificuldade em escrever em poucas palavras aquilo que deseja transmitir e, neste ponto é importante ter alguém que tenha domínio da língua e que, acima de tudo, conheça bem a cultura alemã, entendendo exatamente o que eles esperam ler ou ver. Enfim, a experiência de ter conseguido a vaga no MBA que estou cursando foi e está sendo desafiadora, mas o sentimento da conquista a cada obstáculo ultrapassado me mostra que valeu muito a pena toda a ansiedade e noites mal dormidas.
– E como está sendo a experiência do Mestrado? O que você aprendeu no primeiro semestre e o que lhe empolgou mais?
A experiência está sendo MARAVILHOSA. Ela está sendo maravilhosa em um sentido diferente do que todos imaginam quando lêem essa afirmação, ou seja, ela não está sendo maravilhosa porque está sendo feliz ou perfeita, mas sim pelo que estou aprendendo e vivendo através dela. Chorei quase toda semana durante o primeiro semestre, mas também ri em todas elas, venci em todas elas, cresci em todas elas, aprendi muito em todas elas e me superei em todas elas. Nao foi difícil, foi MUITO difícil. Como eu já disse anteriormente, só tinha estudado um ano de alemão na escola e meio ano em casa pra passar no TestDaf e fora isso só treinava meu alemão nas poucas vezes que encontrava alemães ou meus colegas estrangeiros. E, de repente, passei a ter que falar e ouvir alemão todos os dias e, pior, em contextos completamente específicos e desconhecidos pra mim. Nas primeiras aulas eu só ouvia “blablablabla” e saindo de lá só pensava em chegar em casa e abrir o berreiro. Mas aos poucos fui começando a perceber que nem mesmo os alemães estavam entendendo tudo e isso, acreditem, me fez muito bem. Passado um mês, me senti muito mais “entrosada” e percebi que meu alemão tinha se desenvolvido em silêncio, pois eu não percebia nenhum progresso, mas meus colegas (principalmente os estrangeiros) sempre me mostravam que eu estava sim progredindo. Nos últimos meses comecei a ficar mais próxima dos alemães, o que considero uma das conquistas mais difíceis e gratificantes, pois na minha turma os bichinhos sao bem fechados e arrogantes. O que eu mais gostei até agora foi ter aprendido muito mais sobre os alemães através do ponto de vista deles, ter a oportunidade de conhecer e conviver com diversas culturas dentro de alguns metros quadrados e, lógico, das aulas relacionadas à minha área de interesse, Marketing.
– Só a título de curiosidade, quantas nacionalidades estão reunidas na sua sala de Mestrado?
Como diria você e meu marido mineirinho: “Nossinhora!!!”. Sério, é muita gente de muito lugar diferente, isso é apaixonante e um alívio. Um alívio, pois assim o curso fica mais divertido, interessante e você (como estrangeiro) nao se sente tão deslocado ou sozinho. Só pra vocês terem uma ideia da diversidade, tem gente dos seguintes países: China, Índia, Rússia, Bielorússia, Egito, Cazaquistão, Ucrânia, Bulgária, Camarões, Romênia, Coréia do Sul, Equador, Grécia, Alemanha e Brasil.
– Qual foi a maior dificuldade de vocês aqui na Alemanha nos primeiros tempos?
Meus hormônios (rs) e minha incapacidade de comunicação. Meus hormônios quase deixaram meu marido louco e minha incapacidade de comunicação quase me levou também à loucura. Meu humor sofreu uma alteração jamais vista na medicina, pois era tanta variação que eu cheguei a pensar em procurar um centro espírita pra ver se eu não estava sendo possuída. Mas, sem dúvida, a dificuldade de comunicação no começo foi a parte mais traumática, pois quem me conhece sabe que sou HIPER-comunicativa e por isso acabei desenvolvendo com minhas colegas do curso de alemão um novo vocabulário e uma nova linguagem corporal para conseguirmos nos comunicar sem usar o inglês (nos proibimos totalmente, pois sabíamos que era importante). Resultado: em quatro meses eu já estava falando pelos cotovelos, mesmo que tudo errado. (rs)
– Do que vocês gostam mais aqui da Alemanha? Qual é o local predileto de vocês aqui?
Pra nós a maior vantagem não só da Alemanha, mas principalmente da cidade onde moramos (Stuttgart) é que estamos localizados geograficamente em um ponto ótimo para viajar de carro pela Europa. Mas dentro da Alemanha mesmo o que amamos é (básico) o sentimento de segurança, a infraestrutura incrível e, principalmente, os Biergartens (bares em jardins) e os morangos. Mas, é lógico, que nossos locais prediletos são, é lógico, os Biergartens. (rs)
– E o que faz muita falta pra vocês (estando aqui) lá do Brasil?
As pessoas (insubstituíveis), a espontaneidade, as cores, as roupas (aqui em Stuttgart é um show de horrores), os sabores, os cobradores de ônibus (adorava papear com eles), os odores e água de coco no coco geladinha. (rs)
– Como vocês descobriram a Mineirinha? E o livro dela?
A Mineirinha foi descoberta graças a um feliz acaso virtual, quando eu estava buscando ajuda sobre algo no “Google”. Já o livro foi ela mesma quem me disse sobre ele e não perdi tempo, encomendei o meu rapidinho.
– De que parte do livro vcs mais gostaram?
“Como se sente uma pessoa que muda de país?”, pois você escreveu exatamente o que eu penso e, sinto que se todas as pessoas entenderem as coisas da forma que você colocou, elas poderão aproveitar muito mais a oportunidade maravilhosa que é poder mudar de país nem que seja por pouco tempo.
– Contem um pouquinho deste projeto super criativo do livro “Brasil por brasileiros”!
Esse projeto se tornou a “menina dos meus olhos”. É realmente um projeto inovador, baseado em transparência e coletividade. É assim que podemos definir o projeto do livro ilustrado ainda “sem nome”, chamado nesse período de gestação de “Brasil por brasileiros”. “Brasil por brasileiros” é um nome que, apesar de não ser já o nome definitivo do livro, já nos diz o que é esse projeto. O projeto desse livro é baseado principalmente na premissa de que não há ninguém melhor no mundo para apresentar nosso país através de fotos e relatos do que nós, os brasileiros. E o nosso livro vai além disso, pois ele também irá trazer o que é o Brasil visto por brasileiros de todas as dobras do nosso país. Sim, é nesse ponto que o projeto traz sua idéia de coletividade, afinal a visão que se tem de Brasil no sul, no norte, no leste e no oeste é completamente diferente e muitas vezes inversa e controversa. É um livro que vem sendo projetado e idealizado já coletivamente. No começo era apenas uma idéia crua e sem forma, mas agora com a participação de diversos brasileiros comuns de diferentes eixos do país, a ideia já está amadurecendo e tomando formas variadas e coloridas. Será um livro ilustrado colorido e apaixonante. O fato de ser colorido nao é um desejo estético, mas sim proposital e indispensável, pois as cores fazem o Brasil, ou seja, se queremos mostrar o Brasil, precisamos apresentá-lo com todas sua cores. Apaixonante, pois em cada foto iremos trazer sentimentos e histórias, ou seja, nao serão “apenas” fotos que você vê e diz que são lindas. Serão fotos seguidas de sentimentos e histórias, fazendo com que o leitor aprenda mais sobre nós, sobre nossa cultura e sobre nossa forma de sentir e de viver. Temos hoje mais de 500 fotos já pré-selecionadas de mais de 1000 recebidas e estas já estao sendo publicadas para apreciação e inspiração no Flickr. Ainda não são as fotos definitivas, pois sei que ainda iremos receber muitas outras e, principalmente, sei que muitos outros brasileiros irão logo se juntar a nós, trazendo muito mais imagens e relatos. O objetivo principal do livro não é trazer apenas o que é belo, mas sim trazer tudo que é representativo dentro da nossa realidade. Esse não é um livro para atrair turistas que desejam ver apenas coisas belas, é um livro para ensinar aos turistas estrangeiros e não estrangeiros um pouco mais sobre o que é de verdade o Brasil. Sim, o objetivo não é atrair ninguém de fora, mas sim mostrar aos próprios brasileiros nossa diversidade e riqueza, aumentando dessa forma o respeito entre os eixos e o interesse em criar uma união, partindo da verdade mais pura e importante de que SOMOS TODOS BRASILEIROS. Para saber mais, vocês podem acessar o site oficial do projeto e, caso se identifiquem com o objetivo, sejam bem-vindos para participar e contribuir com suas fotos e relatos!
– Se quiserem deixar um recado para os leitores da Mineirinha, esta é a chance!
Nossa, nós buscamos tanta coisa que fica até difícil lembrar de todas agora. Mas o mais importante nesse momento seria encontrarmos pessoas que estejam dispostas a participar e divulgar o projeto do livro descrito na pergunta acima. Procuramos desde participantes que queiram enviar fotos até profissionais relacionados à area de diagramação do livro. Além disso, procuro contatos com editoras interessadas em publicar essa obra e empresas dispostas a patrocinar o projeto. E, por último, qualquer dica relacionada ao projeto será SUPER bem-vinda.
– O que foi que a Alemanha (ou o povo alemão) lhes ensinou de mais importante até agora?
Acredito que já aprendi muita coisa com o povo alemão até agora. Aprendi com eles coisas que nós não temos muito em nossa cultura e que eu quero levar comigo, mas também aprendi muita coisa que quero deixar bem longe de mim, caso contrário vou perder muitos amigos quando voltar para o Brasil (rs). Mas, agora falando mais sério, acredito que me tornei muito mais direta através da convivência com a cultura local. Isso é maravilhoso! Eu, em comparação com muitos brasileiros, sempre fui um pouco “alemã” nesse quesito, mas agora sinto que estou mais e gosto disso. Mas procuro manter um nível saudável nessa característica, pois como tudo na vida, devemos evitar o extremo. Também aprendi muito sobre a importância de pensar em vários “cenários” na hora de tomar qualquer decisão, pois isso evita fracassos inesperados, mas aqui também é preciso “medir a dose”, pois essa característica costuma diminuir o delicioso “efeito surpresa” na nossa vida e isso eu não posso deixar acontecer. Uma coisa ótima, principalmente para brasileiros aqui, é poder aprender a ser menos emotivo, pois SIM, somos geralmente MUITO emotivos e sempre levamos as coisas para o lado pessoal. Já os alemães brigam, mas logo em seguida já estão como há 10 minutos atrás, como se nada tivesse acontecido. Aqui a gente tem que aprender a separar realmente as coisas, pois ouvimos frequentemente o que não queremos e da forma que detestamos, ou seja, totalmente insensível e tosca, mas mesmo que você chore, será ignorado e se não diminuir sua alta-sensibilidade vai ficar sem amigos e desidratado de tanto chorar.
– Lá na frente quando você pensar na sua vida na Alemanha, do que talvez vai sentir falta?
Dos amigos que fiz, inclusive da Mineirinha.
Aqui o link da Maira no blog dela (Retratos e Relatos), anunciando a entrevista.
E aqui o link de quando ela fez propaganda do livro da Mineirinha na época do lancamento, em dezembro de 2008. 😀