Vi no último final de semana o documentário “Até que enfim posso ser eu – o longo caminho até chegar a mim mesmo” que me ensinou muito em termos de sexualidade feminina e masculina. Existem no mínimo 50.0000 transexuais (em alemão: transexuelle / transgender) na Alemanha. A transexualidade caracteriza pessoas que nasceram biologicamente com um sexo, mas se sentem e querem viver no sexo oposto. Este número pode ser ainda maior, pois o fato não é tratado de forma aberta pela sociedade e várias pessoas afetadas temem a reação de suas famílias e amigos.
Eu não sabia que isso era possível. Da mesma forma não sabia que os travestis só querem se vestir como uma mulher, mas não querem passar a viver como uma mulher, do contrário dos transexuais, que se tiverem o desejo íntimo e o ímpeto de viver como uma mulher, farão de tudo para ser aquilo que consideram ser. Vi no documentário vários homens que se transformaram em mulheres e o contrário, sendo que a transformação de mulher para homem é a que mais envolve cirurgias. Uma moça teve que passar por 14 operações para deixar de ter seios, vagina e útero, e no lugar deles recebeu um órgão masculino capaz até de ereção mecânica, usando para tanto parte da pele/tecido dos seios e do braço.
Do contrário, apresentaram três casos de homens casados com desejos femininos. Um deles vivia uma vida de sucesso, era casado e tinha uma filha. Ele(a) fez todas as operações necessárias para se tornar uma mulher, recebeu apoio da mãe, mas perdeu o contato físico com a ex-esposa e a filha, que só querem manter contato por telefone e só a tratam pelo nome masculino. Ela se tornou uma mulher, encontrou um namorado e se casou alguns anos mais tarde, realizando seu sonho, de ser princesa por um dia. O outro também era casado e tinha uma filha, trabalhava como elétrico e um belo dia também resolveu dizer a verdade para sua esposa. Para ela o mundo caiu a princípio, mas com o tempo a esposa passou a aceitar o lado feminino do marido, que foi se transformando em mulher, e foi aceito também pela filha. Hoje eles continuam juntos, casaram-se novamente há alguns anos atrás como prova de seu amor, consideram que o amor ficou até mais forte e a elétrica, agora em corpo feminino, conseguiu manter seu emprego e sua vida intactos. Mostraram ainda um terceiro caso, o de um homem casado que um dia contou para sua esposa que adorava andar vestido como mulher. Esta resolveu aceitá-lo como ele era e hoje ele vive feliz, homem no dia-a-dia, e mulher durante parte de suas horas de lazer.

A transformação de mulher para homem não é menos fantástica. Quem aí ousaria dizer que este homem lindo acima, Bastian Buschbaum (mais fotos aqui), um dia já foi mulher e se chamava Yvonne?!? Ele escreveu um livro contando como foi o processo de deixar de ser uma atleta famosa e passar a ser um homem, intitulado Blaue Augen bleiben blau: Mein Leben
(Olhos azuis continuam azuis: minha vida). No documentário foram mostrados vários outros casos, até o de um garoto de 13 anos, que desde há pouco tempo está podendo viver como menino apesar de ter nascido como uma menina, recebendo o apoio dos pais depois de um longo caminho de desencontros e desentendimentos e muita agressão para consigo próprio e para com a sociedade.
Por último, o documentário mostrou uma combinação que eu não sabia que existia: a de pessoas que vem ao mundo literalmente com ambos os sexos. No passado a família ou os médicos definiam qual seria o sexo da pessoa, na esperança de que ela se identificasse com a escolha. Mostraram alguns casos de pessoas que não puderam se identificar com a decisão feita por ocasião de seu nascimento, tendo passado a viver como homens ou mulheres, literalmente renascendo para o mundo no sexo oposto. O documentário procurou mostrar como a sociedade e a medicina estão mudando com o passar das décadas, se abrindo, aceitando casos diferentes e que a medicina vem se especializando para proporcionar a essas pessoas a possiblidade de viver com o corpo que consideram ser seus, tal como desejam.
Um caso chocante é mostrado no final: um homem hoje com 48 anos, Thomas, que nasceu com os dois sexos mas os pais nunca lhe contaram do acontecido. Ele foi obrigado a tomar hormônios sem saber o que estava tomando, e aos 19 anos fez uma operação para retirar seu útero, e só foi descobrir isso anos depois. Agora ele está movendo um processo contra o médico que fez a operação na época, entrou com um outro processo para poder alterar seu nome para Christiane, toma hormônios femininos mas mesmo assim não se sente feliz com seu corpo, por parecer um homem, resultado do tratamento de hormônios masculinos do passado. Ele disse não saber o que é um relacionamento, não tem amigos e se sente sozinho, mas finalmente descobriu quem é: uma mulher.
O documentário mostrou que a onda de pessoas que passaram a viver como gostariam aumentou com a advinda da internet. Foi através da internet que várias destas pessoas buscaram ajuda para se encontrarem com outros que passavam pela mesma situação e poderem entender melhor o que se passava com elas próprias. O documentário mostra que há mais verdades na Terra do que aquilo que conseguimos enxergar com nossos próprios olhos, que o Universo é mais complexo e diversificado do que imaginamos. Todos os exemplos apresentados servem para esclarecer, ensinar e apelar pela compreensão da sociedade, contribuindo para a diminuição do preconceito e da discriminação, pois a pessoa que nasce em outro corpo quer afinal aquilo que todos nós queremos: ser felizes e sentir que chegaram onde queriam ter chegado.
Para ver um pequeno resumo do documentário, clique aqui. Para ler mais sobre o documentário em alemão, clique aqui.
Fonte: documentário de 15/05/10 “Endlich ich – der richtige Körper für mein Leben” (Até que enfim posso ser eu – o corpo certo para minha vida), produção da Vox/Spiegel TV.
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