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::Passeio Socrático::

29/09/2010

Autor: Frei Betto

Ao viajar pelo Oriente mantive contatos com monges do Tibete, da Mongólia, do Japão e da China. Eram homens serenos, comedidos, recolhidos e em paz nos seus mantos cor de açafrão.

Outro dia, eu observava o movimento do aeroporto de São Paulo: a sala de espera cheia de executivos com telefones celulares, preocupados, ansiosos, geralmente comendo mais do que deviam. Com certeza, já haviam tomado café da manhã em casa, mas como a companhia aérea oferecia um outro café, todos comiam vorazmente. Aquilo me fez refletir: ‘Qual dos dois modelos produz felicidade?’

Encontrei Daniela, 10 anos, no elevador, às nove da manhã, e perguntei: ‘Não foi à aula?’ Ela respondeu: ‘Não, tenho aula à tarde’. Comemorei: ‘Que bom, então de manhã você pode brincar, dormir até mais tarde’. ‘Não’, retrucou ela, ‘tenho tanta coisa de manhã…’. ‘Que tanta coisa?’, perguntei.. ‘Aulas de inglês, de balé, de pintura, piscina’, e começou a elencar seu programa de garota robotizada. Fiquei pensando: ‘Que pena, a Daniela não disse: ‘Tenho aula de meditação!’

Estamos construindo super-homens e super-mulheres, totalmente equipados, mas emocionalmente infantilizados.

Uma progressista cidade do interior de São Paulo tinha, em 1960, seis livrarias e uma academia de ginástica; hoje, tem sessenta academias de ginástica e três livrarias!

Não tenho nada contra malhar o corpo, mas me preocupo com a desproporção em relação à malhação do espírito. Acho ótimo, vamos todos morrer esbeltos: ‘Como estava o defunto?’. ‘Olha, uma maravilha, não tinha uma celulite!’ Mas como fica a questão da subjetividade? Da espiritualidade? Da ociosidade amorosa?

Hoje, a palavra é virtualidade. Tudo é virtual… Trancado em seu quarto, em Brasília, um homem pode ter uma amiga íntima em Tóquio, sem nenhuma preocupação de conhecer o seu vizi­nho de prédio ou de quadra! Tudo é virtual. Somos místicos virtuais, religiosos virtuais, cidadãos virtuais. E somos também eticamente virtuais…

A palavra hoje é ‘entretenimento’. Domingo, então, é o dia nacional da imbecilização coletiva. Imbecil o apresentador, imbecil quem vai lá e se apresenta no palco, imbecil quem perde a tarde diante da tela.
 
Como a publicidade não consegue vender felicidade, passa a ilusão de que felicidade é o resultado da soma de prazeres: ‘Se tomar este refrigerante, calçar este tênis, ­ usar esta camisa, comprar este carro, você chega lá!’

O problema é que, em geral, não se chega! Quem cede desenvolve de tal maneira o desejo, que acaba­ precisando de um analista. Ou de remédios. Quem resiste, aumenta a neurose.

O grande desafio é começar a ver o quanto é bom ser livre de todo esse condicionamento globalizante, neoliberal, consumista. Assim, pode-se viver melhor..

Aliás, para uma boa saúde mental, três requisitos são indispensáveis: amizades, auto-estima, ausência de estresse.

Há uma lógica religiosa no consumismo pós-moderno. Na Idade Média, as cidades adquiriam status construindo uma catedral; hoje, no Brasil, constrói-se um shopping center. É curioso: a maioria dos shoppings centers tem linhas arquitetônicas de catedrais estilizadas; neles não se pode ir de qualquer maneira, é preciso vestir roupa de missa de domingo. E ali dentro sente-se uma sensação paradisíaca: não há mendigos, crianças de rua, sujeira pelas calçadas…

Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano pós-moderno, aquela musiquinha de esperar dentista. Observam-se os vários nichos, todas aquelas capelas com os veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas sacerdotisas.

Quem pode comprar à vista, sente-se no reino dos céus. Se deve passar cheque pré-datado, pagar a crédito, entrar no cheque especial, sente-se no purgatório. Mas se não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno… Felizmente, terminam todos na eucaristia pós-moderna, irmanados na mesma mesa, com o mesmo suco e o mesmo hambúrguer do Mc Donald…

Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das lojas: ‘Estou apenas fazendo um passeio socrático’. Diante de seus olhares espantados, explico: ‘Sócrates, filósofo grego, também gostava de descansar a cabeça percorrendo o centro comercial de Atenas. Quando vendedores como vocês o assediavam, ele respondia:´Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser feliz!”

::Cinema Paradiso::

22/09/2010

Anos passados
Cabelos grisalhos
Quilos a mais
Histórias pra contar
Amor por outro(a)s – (será que existe mesmo mais de uma alma gêmea?)

Filhos
Dívidas
Dúvidas
Carinho
Admiração

Relembrar os velhos tempos
Reencontrar no outro a si próprio
Quem fui
Como me tornei
Quem hoje sou

Buscar no olhar do outro
Cumplicidade
Explicar decisões
Justificar direções

Vidas paralelas
Que se cruzam uma vez mais
Pra logo voltarem a ser
Paralelas

Pela força do que
As tinha unido outrora:
O tempo e o espaço
O espaço e o tempo

Sandra, 21.08.2010

::Transmimento de pensação – notas pessoais sobre o Brasil atual::

21/09/2010

Dentre as mil e uma “pensações” durante minha viagem ao Brasil, rascunhei umas indagações que me vinham à cabeça aqui e ali durante a permanência na terrinha:
– O Brasil está inundado de notícias negativas, que formam a opinião do povo e os comandam mentalmente, certamente atormentando-os dia e noite sem nenhuma pausa;
– O Brasil continua com mania de “ser pequeno”, com uma tendência à inferioridade que eu sinceramente não consigo entender. Li várias vezes que “estamos atrasados”, “precisamos melhorar muito”, “lá fora tudo é melhor”, etc., até em quesitos onde o Brasil vai super bem. O Brasil já avançou tanto em tantas áreas, faz parte hoje dos países BRIC e do G20, mas continua achando que muitíssimos outros são melhores do que ele. A não ser nos horários de propaganda gratuita dos partidos (que coisa estranha são aqueles preciosos horários não usados sem programação, com a tela estática!), não vi, ouvi ou li nada sobre tudo de bom que vem acontecendo no país nos últimos anos;
– A noção de cidadania vem chegando a passos pequeninos, mas vem. Ouvi repetidamente os pedidos principais da população: melhoria nos setores da saúde, educação, segurança e infra-estrutura;
– Finalmente uma campanha política sem aquele mar de santinhos de antigamente! No lugar delas, gingles e pessoas pagas segurando bandeiras sem nenhuma emoção, invariavelmente clicando em seus celulares;
– Os conceitos de “meu espaço” e “seu espaço” são quase inexistentes (p.ex. eu na cama tentando dormir e um povo na rua fazendo barulho, gritando, falando altíssimo, etc.);
– O nosso povo é maravilhosamente solidário! Isso é um diferencial e algo característico nosso que não tem preço!
– O nosso país verde tropical está quase sem árvores em perímetro urbano, como se o homem se visse superior à natureza;
– O Brasil está (pelo menos no momento) mais caro do que a Alemanha! E bastante mais caro do que em 2008, mesmo descontando a diferença cambial. Ao perguntar sobre este ponto, fui informada de que os salários aumentaram e a diferença foi repassada para o consumidor final. Menos mal.
– Fabricamos carros capazes de rodar com três combustíveis diferentes! 🙂
– E a música brasileira continua linda, linda, linda!
– A cada vez que vou ao Brasil, poderia engordar e voltar rolando pra Alemanha. Viva nossa cozinha maravilhosamente deliciosa!
– Vi poucos bichos no Brasil (bichos não conhecem fronteiras como nós humanos!);
– Dirigir no Brasil continua sendo uma aventura mortal. Vi até um carro da Polícia Federal ultrapassando em faixa contínua!!!
– Vou morrer sem entender as queimadas destruindo nossas matas. Viajei de Beagá a Porto Seguro (ida e volta) e cansei de ver queimadas por todas as estradas que passei;
– Como sempre contei inúmeros postos desnecessários de trabalho, na maioria das vezes criados para que um funcionário controle o outro e engorde o bolso do patrão ou pra passar uma suposta segurança pro cliente;
– Quem será o presidente que receberá o mundo na Copa de 2014??? Pelo andar da carruagem, será a Dilma, não é mesmo? O que vocês acham dela?
– Há muito mais carros no Brasil atualmente, ônibus e caminhões velhos poluem o ar e espalham mal cheiro por todas as partes. Disseram que em 2009, ao contrário da Alemanha, o governo brasileiro incentivou a compra de um novo carro sem pedir de volta os carros antigos. Perderam uma boa oportunidade pra diminuir a emissão de CO2!
– Há tanto carro rodando nas ruas que não via há séculos (Kombi, Caravan, Brasília, etc.);
– Por que será que apesar de termos espaço e da Copa 2014 estar chegando, só temos rodovias quase que só com uma via? A construção de mais rodovias com 2 vias de cada lado desafogaria o trânsito e tornaria as viagens bem menos perigosas. A limitação do tráfego de caminhões para um determinado horário e/ou dias também poderia ajudar neste quesito;
– A corrupção continua institucionalizada, na base do “rouba, mas faz”;
– Campanhas lindas na tevê, p.ex. “não venda seu voto”, “não vote em candidatos que sujem sua cidade”, “o normal é ser diferente”, etc.
– Será que teremos tempo para expandir a infra-estrutura do país até 2014?
– O Faustão magro já não é mais o mesmo, agora ele virou um “Faustinho”, o Jô também está bem mais magro, o Sílvio Santos (como sempre) não mudou uma palha. O microfone dele continua exatamente no mesmo lugar, hehehe… E que horror aquelas meninas rebolando pra lá e pra cá durante tantos programas na tevê. Isso é coisa do tempo do Chacrinha e deveriam existir atividades muito mais interessantes para essas mulheres (muito bonitas por sinal) do que ficar rebolando na telinha!
– Os pivetinhos sumiram há muito da paisagem urbana, no lugar deles dizem que o tráfico de drogas impera no país;
– O nosso povo é maravilhosamente solidário! Isso é um diferencial e algo característico nosso que não tem preço!
– Rever bons velhos amigos é tudo de bom 🙂
– Como Caetano, às vezes eu me sinto uma estrangeira no Brasil, mas sinto ao mesmo tempo uma falta “danada” de lá também!
Se você leu até aqui, certamente vai ter muito para comentar. Mãos à obra! 🙂

::Volta de viagem e novidades::

14/09/2010

Chegar de viagem do Brasil e não achar nenhuma mala na esteira é dureza. Por outro lado a ausência dos pertences pessoais me fez agradecer por termos chegado sãos e salvos do outro lado do mundo. 4 dias depois as malas chegaram, exatamente quando já estávamos começando a fazer planos sobre o que compraríamos no lugar de tudo o que tinha sido perdido.

Desde então, uma semana se passou e tenho muita novidade pra contar. Depois de 2 anos de doença, muita pesquisa, insistência e trabalho conjunto, meu marido abriu a loja dos sonhos dele, a XGames, onde ele vende, compra e troca videogames e filmes novos e usados, com atendimento em português, espanhol, inglês e naturalmente em alemão. Ontem já tivemos clientes australianos na loja! 🙂 No Facebook dá pra ver algumas fotos da abertura. É só adicionar a XGames Radolfzell. Coloquei um link à direita do blog, pois daqui a algumas semanas ele vai estar oferecendo seus produtos também online. Aguardem!

Soprei velinhas imaginárias e completei 40 anos. Muitos amigos ligaram, deixaram recados, me deram os parabéns das mais variadas formas. O presente mais lindinho de todos os tempos eu ganhei da Ceci, uma Amiga com A maiúsculo. Obrigadíssima, Ceci! 🙂

::Ó Minas Gerais – apelo por uma Belo Horizonte mais verde::

01/09/2010

Hoje vi uma apresentação de Powerpoint da antiga Belo Horizonte, minha cidade natal. Vi fotos principalmente do começo até a metade do século passado (1900-1950) e fiquei muito abalada com as fotos da Av. Afonso Pena, nossa principal avenida, para onde aliás foi transferida há alguns anos a feira Hippie” aos domingos, excelente feira de artesanato que antes acontecia na Praça da Liberdade. Nesta avenida, na foto de outrora, há um verdadeiro “tobogã” de árvores, que vão do alto da avenida até a parte mais baixa, em duas correntes paralelas, dividindo-se para outras vias principais que cruzam aquela avenida e passando pela Igreja São José (sem grades na entrada!).

Belo Horizonte cresceu, se desenvolveu e o progresso fez com que as árvores praticamente sumissem do cenário da cidade. Em seu lugar, a poluição de todas as formas teima em enfeiar o ar, o visual, etc. Até a poluição sonora, ainda mais em épocas eleitorais, me pertuba muito. Por que será que o homem sente-se senhor da natureza, algo superior àquilo que vê ao seu redor? Por que as árvores não têm vez em perímetro urbano, sendo que sua existência aliviaria o ar para os próprios moradores das “cidades grandes” e traria mais beleza à cidade?

Do contrário, as poucas árvores têm mais é que lutar com o espaço limitado, os muitos fios de eletricidade e a mensagem de que não são bem-vindas e na verdade incomodam. Ao mesmo tempo que dou boas-vindas ao desenvolvimento econômico da cidade, sinto pelas árvores. O crescimento não tem sido de maneira nenhuma sustentável. Deveriam haver leis que limitassem as emissões de gases das fábricas, carros, ônibus e caminhões (principalmente dos mais velhos, movidos a diesel, que rodam pela cidade emitindo uma nuvem preta e fedorenta) e contribuíssem para um ar mais limpo. Deveriam haver leis que preservassem a natureza, dentro e fora das cidades. Passou uma reportagem durante a semana na tevê falando que por causa da atual baixíssima umidade relativa do ar no Brasil, digna de um deserto, as pessoas sofrem e pagam com sua saúde, e que em bairros paulistanos com menor índice de verde por metro quadrado (10 m2/pessoa), as pessoas estavam sofrendo mais com o ar seco. Admirei-me ao ver que Beagá se exalta de ter míseros 3,5 m2 de verde por pessoa! Parece que aceitaram que precisam do verde sim, mas o aceitam fora da cidade. E as queimadas? Eu nunca vou as entender. Li hoje no jornal local que elas aumentaram 125% em relação ao ano passado. Caetano Veloso escreveu que, quando jovem, se dizia escandinavo, pois gostava da ideia de viver em um país igualitário e limpo. Ainda hoje, ele se sente um estrangeiro no Brasil. Acho que eu também, pelo menos nesses aspectos. E viva o concreto! Viva o crescimento e o desenvolvimento econômico! Que se danem as crianças, que serão as que estarão vivendo nas selvas de pedra brasileiras de amanhã. Isto, caso muitas delas estejam vivas até lá.


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