Semana passada fui num encontro de mulheres (a maioria delas alemã) que me fez pensar muito. Deparei-me com um grupo altamente qualificado, altamente alienado, altamente feliz. Pelo menos aparentemente. Com o andar da conversa, uma delas comentou que vê de longe quem assiste muita televisão, pois a pessoa é medrosa, muitas vezes paranóica. Criticaram o nível da tevê alemã, que é aliás um assunto super crítico aqui na Alemanha, pois parece ser parte da origem de todos os problemas, sendo vista quase que 100% negativamente. Argumentei que aquilo que vimos é um reflexo do nosso interior, e que tenho o livre arbítrio pra escolher na tevê excelentes documentários, bons filmes, bate-papos, noticiários, disse que tem muita coisa ruim, mas muita coisa boa também. Como tudo na vida, depende de encontrar um meio-termo. Esta não era a opinião da maioria, que evita não só tevê, como também todo e qualquer tipo de noticiário. No meio da discussão, quando eu comentei que tenho me informado muito no momento sobre p.ex. o Wulff, uma delas me perguntou quem era ele. Minha resposta foi placativa:
– O seu presidente!
E a resposta, impressionante:
– E do que me adiantaria saber sobre o que ele fez ou deixou de fazer? Eu não votei nele! E para que essa informação vai adiantar na minha vida? Só pra poder falar alguma coisa numa roda de bate-papo como esta?
Sinceramente, fiquei chocada. Eu argumentei, junto de outra amiga não-alienada, que devemos nos informar para tomar decisões, que o ideal seria uma democracia participativa, como no caso do Stuttgart 21, pras pessoas poderem participar de decisões que influenciam suas vidas. A contra-argumentação também me deixou perplexa:
– Eu não fui votar no plebiscito do Stuttgart 21, pois não sei nada deste projeto. Não sei e não quero saber. Ele não me importa. E como não me importa, não quis participar.
Saí de lá pensativa e perplexa. Já passei por uma fase bem enorme na minha vida onde me importava e me doía toda a pobreza e toda a injustiça do mundo. Mais tarde, compreendi que não há justiça absoluta e não posso sofrer as dores do mundo. Mesmo assim, continuei antenada. Praticamente não passo um dia sem me informar sobre o que está acontecendo no mundo. Por um lado, as transformações, acidentes (p.ex. o acidente do Cruzeiro na costa italiana) e tsunamis da vida me assustam muito. Por outro, vejo tanta coisa mudando pra melhor, como a caída dos ditadores, o avanço da democracia, a luta pelos direitos humanos…. Vejo com expectativa e grande interesse o mundo à nossa volta e quero fazer parte de uma transformação positiva, mesmo que minha participação direta seja pequena. Sim, o mundo atual é pesado. Mas só consigo “tirar férias dele” quando saio, eu mesma, de férias.
A atitude daquelas mulheres me fez ficar pensando sobre quanto de alienação e egoísmo seriam necessários pra eu me sentir feliz. Eu me importo demais, penso demais, raciocino, leio, troco, falo, penso, repenso, leio até no último minuto antes de ir dormir. Falando sobre o assunto, perguntamos pra alguns alemães o que significa “alienado” em alemão. Ambos responderam “Eremit” (eremita), mas esta não era naturalmente o sentido da palavra. Pesquisando um pouco mais, achei as traduções: “entfremdet” e, ainda mais forte, “geisteskrank” (louco, dentre outros significados). Não, eu não quero ser nada disso. Vou continuar lendo como sempre.
“A alienação trata-se do mistério de ser ou não ser, pois uma pessoa alienada carece de si mesma, tornando-se sua própria negação. Alienação refere-se à diminuição da capacidade dos indivíduos em pensar em agir por si próprios”.
Fonte: Wikipedia
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