Você já viu a propaganda que o supermercado alemão Edeka lançou por ocasião do Dia das Mães? Caso ainda não a tenha visto, clique aqui.
E aí, qual é sua opinião? “Mamãe, obrigada por você não ser o papai”… A minha é de que é uma propaganda um tanto quanto infeliz. O intuito com certeza era o de mostrar que ser mãe é algo insubstituível, que ninguém toma o lugar de uma mãe, que mãe só tem uma, cada um a sua. Meu marido vê a propaganda assim, com seu tom altamente irônico, sob a perspectiva de uma criança, e ele da sua parte não ficou chateado com ela.
Mas a grande verdade é que a maioria das pessoas não gostou dessa propaganda, quer sejam elas mulheres ou homens. Os homens, claro, por não aceitarem serem redimidos a aqueles que não sabem fazer nada em casa, que não conseguem fazer nem as tarefas mais simples e não têm o menor tato ao lidar com seus filhos. As mulheres, por várias razões, eu diria:
- Por um lado, porque a propaganda passa aquela ideia romântica da mulher dona de casa, daquela que é a “dona do pedaço”, cujo lugar ninguém toma;
- Ainda assim, a propaganda passa a ideia simplória das atividades domésticas e de uma mãe no cuidado de seus filhos;
- Como terceiro ponto eu citaria que nós mulheres (pelo menos posso falar por mim) não queremos ser elogiadas em detrimento de outras pessoas, nem de outros homens, nem de ninguém. Acho até que a propaganda pode ser vista dentro do ângulo da cultura alemã, que chega a usar desse artifício com frequência: falar mal de um grupo para enaltecer outro… não, não caiu bem mesmo!
Eu vou nesse supermercado quase toda a semana e nem por isso vou parar de fazer compras nele. Tem frutas e legumes regionais, um tamanho aceitável e um bom sortimento de produtos. Mas com essa propaganda o Edeka passou dos limites e já há chamados de boicote contra ele… que perdeu uma grande chance de prestar uma homenagem, dando alfinetadas sim na sociedade, mas não alfinetadas desse tamanho!… Poderia ter escolhido algo no limiar do tragicômico, como na propaganda anterior onde um velhinho anunciou sua própria morte para que os familiares finalmente se reunissem no Natal. Dessa vez foi um tiro pela culatra, e o troco que o supermercado está recebendo vem de todos os lados, está virando mesmo um shitstorm!….
Até a Ministra da Família da Alemanha, Kerstin Schreyer, se pronunciou a respeito da propaganda. Ela disse que só faltava essa de se fazer uma homenagem às mães em detrimento dos pais, e que a paternidade não pode ser vista como uma competição entre pais e mães. Colocar pais contra mães e vice-versa não deveria ser o objetivo de nenhuma homenagem. „Homens não são a parte pior da família. A propaganda sugere que homens sejam incompetentes na educação e no cuidado de seus filhos e tenta reconfirmar papeis antigos do homem provedor e da mulher dona de casa. Todo tipo de clichê foi atendido com essa propaganda e em termos da discussão da igualdade de gêneros já tínhamos chegado mais longe do que isso!”
Concordo plenamente com sua opinião e queria acrescentar mais um grupo que foi totalmente esquecido pelos criadores da propaganda: a dos pais que cuidam de seus filhos sozinhos, sem a presença da mãe, quer seja por motivo de força maior, ou por decisão própria da mãe de ter deixado a família. Esses pais, que são pai e mãe ao mesmo tempo, e também as mães ditas solteiras (se bem que o Papa corrigiu tão lindamente e disse que paternidade não é estado civil!), pois então as mães que são mães e pais ao mesmo tempo, esses seres que assumem a paternidade sozinhos é que mereciam a atenção de uma propaganda, para através deles mostrar que pra ser pai e ser mãe não tem receita de bolo e ninguém nasce sabendo como educar e cuidar perfeitamente de um filho. Faz-se o melhor possível, dentro das capacidades de cada um. Todas as maneiras, se feitas com amor, são louváveis e motivo de reconhecimento! E reduzir o amor dos pais a seus filhos ao nível de competição entre os gêneros não está com nada.
Li que um cliente do supermercado concorrente mais famoso da Alemanha, o Aldi, exclamou, satisfeito: “Aldi, muito obrigado por você não ser o Edeka!“… E outro completou, muito decidido: “Obrigado pelos anos em que fiz compras aí! A partir de agora, vou visitar outros supermercados, onde pais não são cidadãos de segunda classe!“…
No momento que escrevo, 08 de maio às 20:47 horas da noite, a propaganda foi vista mais de 1,2 milhões de vezes, com pouco mais de 7.000 pessoas que gostaram dela e mais de 36.000 que não gostaram!…
Tenho dito… e Feliz Dia das Mães para todas nós, mães imperfeitas, às vezes chatas, às vezes reclamonas, às vezes intransigentes, às vezes brigonas, certamente com muito amor, carinho e consideração para dar e vender… com um coração do tamanho do mundo, com comidinha, com bolo, com abraço, com beijinho, com bordado, com flor, com jardim multicor… Somos tantas, de tantos tipos, e certamente queremos que os pais sejam tão bem respeitados como nós mesmas queremos e merecemos ser!
Fonte: Jornal Merkur, reportagem de 08 de maio de 2019.
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