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::Dois anos de pandemia – e por onde anda a fé na humanidade?::

21/02/2022

Já estamos metidos nesta lenga-lenga há dois anos, e a capacidade comercial e mercantilista do ser humano o fez capaz de criar máscaras de luxo, perceber que oferecer testes de COVID dá dinheiro… O ser humano capitalista sempre acha um novo método de como fazer dinheiro. 

Enquanto isso, as tragédias não querem cessar, enquanto a natureza continua avisando que a estamos destruindo e ela joga fogo, ar (ventos fortes, furacões), água, todos os elementos nos são devolvidos, um após o outro, para que talvez consigamos perceber que CHEGA, que temos que implementar medidas imediatas para nos salvar, para salvar nosso planeta, se quisermos que ele continue a ser a casa das próximas gerações. 

A mesquinhez do ser humano potente e louco pelo poder não deixa por menos e coloca o mundo mais uma vez à beira de uma guerra imbecil, inútil, desnecessária. Cá estamos nós, em pleno fevereiro de 2022, como se nunca tivéssemos passado por tanta tragédia, discutindo sai dia, entra dia, sobre o perigo eminente de uma guerra entre o ocidente e a Rússia ante uma possível invasão da Ucrânia. Me poupem, eu quero descer!… Por outro lado, vemos a mesquinhez individual correr também solta nos exemplos do Tinder Swindler e da Anna russo-alemã que passou a perna em toda a high society de Manhattan enquanto eles tinham como objetivo mera e simplesmente aumentar sua própria riqueza e campo de influência. 

Mas enquanto tudo parece mais o fim de um mundo que talvez não nos mereça, eu busco luz. Luz nos encontros possíveis do dia a dia. Luz nas trocas dignas de irmãs que vêem o massacre nu e cru de um Brasil machista e desigual, mas não o aceitam. Mesmo tendo ficado boquiaberta com um estudo da Universidade de Brasília sobre grupos masculinos durante a pandemia, sobre quais mensagens muitos homens brasileiros trocaram durante meses na pandemia, eu passo pela nojeira do artigo, ainda que necessário, e me vejo discutindo com mulheres que querem crescer e ajudar outras a crescer, a ocupar seus espaços, a se abraçar enquanto pessoas, com todas as suas partes e verdades que elas levam consigo: gorduras, rugas, cabelos brancos, celulites, tudo e mais um pouco com o que elas se preocupam, levando em conta também que muitas outras estão lutando lutas bem mais duras como a da pobreza, da doença, da saúde física e mental debilitadas. Elas buscam por qualidade de vida, e se voltam para si – interessante quando vejo em um grupo de homens o movimento inverso, que não se voltam para si, mas contra as mulheres. Parece que ainda vale a pena atacá-las, então?

Parece que sim, vale sim. Ainda que cumpramos muito mal o nosso papel de nos representar, de nos solidarizar, de manter nossa bandeira bem no alto, mas ainda assim incomodamos, ainda mais durante a pandemia. Mesmo que durante a pandemia tenhamos conseguido dar muitos passos para trás, porque a pobreza da mulher aumentou, muitas mulheres estão pedindo para reduzir seu horário de trabalho para dar conta dos afazeres pandêmicos que incluem casa e filhos estudando em casa, e enquanto muitas meninas não voltam para as escolas simplesmente porque enquanto estavam em casa durante a pandemia foram casadas por seus pais, e agora se ausentarão para sempre das aulas. Tarde demais para elas, infelizmente. 

No meio desta lama, continuamente à procura de luz, eis que anuncio três ou quatro possibilidades encontradas com muita dificuldade durante a pandemia, umas por acaso, outras fruto de muita pesquisa e planejamento, outras por investimento puro e simples, o de respirar e fechar os olhos. Vejamos:

  1. Fechar os olhos, respirar e buscar o meu mundo interior foi uma das melhores atividades até agora durante a pandemia. Ainda que eu reconheça que o simples ato descrito anteriormente nem sempre – ou quase nunca – faça com que eu consiga visitar meu mundo interior, pelo menos – e que maravilha poder dizer isso! – agora eu tenho um, só meu. Lá sempre faz sol! Já o visitei com riqueza de detalhes. Mas continuo explorando, sempre quando minha inquietude deixa. 
  2. Viajar nunca foi tão essencial quanto é agora. Dar aos olhos o presente de ver coisas diferentes, respirar outros ares e encher a memória de outra coisa que não seja os detalhes das nossas quatro paredes se tornou algo essencial, ainda que muito mais caro, capitalismo, pandemia e inflação que o diga! Ainda assim, repito. Essencial!
  3. Ter fé também é imperativo. Tento intercalar a avalanche de notícias ruins com coisas, conversas, exemplos, livros bons! Um deles, indico em alto e bom som, o documentário 2040 na Netflix. Que todos, principalmente os mais jovens o vejam, pois o mundo precisa de mais fé e esperança, não só no que pode vir, mas acima de tudo naquilo que já existe e está sendo feito HOJE de bom no mundo.
  4. Completando um ano de lançamento do meu último livro, o HERstory, continuo na reflexão de como nós mulheres não conhecemos a nossa própria HERstória, como muitas de nós tem vergonha de dizer que sim, somos feministas, não porque somos contra os homens, mas sim porque queremos andar lado a lado com eles na construção de um muito mais justo, solidário e igualitário para ambos. Neste sentido, indico um documentário que acabei de achar por acaso também no Netflix, durante o qual aprendi muito e, munida do gás que ele me deu, escrevi estas linhas – deixei passar muito tempo sem escrever!… Se você, homem ou mulher, jovem ou velho, não importa quem seja, se estiver com tempo e não tiver nada urgente para fazer na próxima hora que segue, sugiro: largue tudo, aperte o botão e assista este documentário histórico das lutas femininas que é o Feministinnen: was haben sie sich gedacht? (Feministas: o que elas estavam pensando?). Da cineasta independente americana Johanna Demetrakas. O documentário é de 2018, mas é como se tivesse sido feito ontem. No meio do documentário aliás uma mulher se pergunta por que ainda tem que ir às ruas para protestar pelas mesmas coisas sobre as quais já tinha protestado há anos junto de sua mãe.
  5. A lista poderia ser interminável e é por isso que eu peço as suas dicas para se manter lúcido e vivo. Obrigada pelos comentários!

P.S.-Se houver algo que você goste muito de fazer como no meu caso com relação à escrita, não fique meses a fio sem praticar. Isso desconecta neurônios… Passei pelo menos o mesmo tempo escrevendo quanto procurando uma maneira de acessar meu blog. Enfim…

::Vale a pena ser feminista na Alemanha?::

03/12/2017

Eu sempre responderia a essa pergunta com um claro SIM! Mas por que, ainda nos dias de hoje, alguns certamente perguntariam.

Que tipo de discriminação uma mulher sofre nos dias atuais na Alemanha? Vou citar algumas delas: há discriminação salarial, discriminação em relação a postos de poder/liderança e recentemente a Alemanha só conseguiu colocar mulheres em grande quantidade dentro de conselhos administrativos de empresas que fazem parte do índice DAX porque impôs isso como cota prevista por lei. A maior parte dos estudantes são mulheres, mas elas não estão representadas da mesma maneira no mercado de trabalho, por várias razões, como os homens. Só o fato de uma mulher ter que trabalhar pouco ou meio período pra cuidar de filhos e familiares, só isso já é um tipo indireto de discriminação. Durante esse tempo, ela poderia estar atuando no mercado e galgando promoções e aumentos salariais. Uma mulher que busca um posto de trabalho enquanto pode casar e ter filhos, pode ser descartada somente por essa suposição, que logicamente não será alegada porque discriminação de gênero é algo proibido aqui na Alemanha (AGG). Se uma mulher tem filhos e descobrem que eles são pequenos, ela pode perder a oportunidade de conseguir um emprego ou uma promoção pelo mesmo motivo, pois a suposição de que o cuidado com os filhos é algo estritamente ligado à mulher, ainda está muito enraizada aqui e em muitas outras culturas. Ainda há razões para ser feminista aqui, no Brasil e em qualquer lugar no mundo! Observem cada foto que é tirada de empresas, de políticos, etc. Quantas mulheres aparecem por lá? Somos a metade da população e deveríamos ter metade da representação, ou próximo a esse patamar!

Inconscientemente, muitas vezes, ainda contribuímos para esse viés, não confiando no nosso taco, negociando pouco os salários, deixando de nos vender de forma positiva em uma entrevista, etc. Vou a fundo nessas questões no meu livro, o (Re)descobrindo Quem é Você.

Mesmo reconhecendo o avanço dos últimos anos em terras germânicas, os muitos homens que empurram carrinho de bebê nas ruas, que tiram licença paternidade, as mulheres que pilotam ônibus, trens e aviões, ainda há muito por ser feito. Um pequeno exemplo: a Alemanha prevê por lei o direito a trabalho em período parcial (Teilzeitgesetz), direito esse que é usado mais por mulheres, que acabam por reduzir seus salários e diminuir suas contribuições para a aposentadoria. Mesmo assim, inegavelmente é um direito que contribui para que muitas mulheres continuem trabalhando, mesmo que estejam arcando com as consequências.

Vivemos em um mundo onde o peso da educação dos filhos e os cuidados com a casa pesam sobre os ombros das mulheres, sendo que dividimos o mesmo teto com nosso parceiro, pai de nossos filhos, que pode e deve assumir 50% das responsabilidades dentro e fora de casa, como um time que funciona junto para ganhar junto.

::Catarina de Bora / Catarina Lutero::

05/11/2017

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Em alemão, o nome da esposa de Martinho Lutero (Martin Luther) era Katharina von Bora ou, depois do casamento, Katharina Luther. Ela foi freira católica, mais tarde esposa, mãe de seis filhos, mulher de negócios, dona de uma pensão e de uma cervejaria, de campos que usava para plantar os legumes e criar os animais que usaria para oferecer refeições aos clientes da pensão, entendia de ervas medicinais, tinha tempo para jardinagem, cuidado de animais, compra e venda de imóveis, administração dos negócios e propriedades… Era uma mulher com voz e pensante, que nasceu em 29 de janeiro de 1499 e viveu até 20 de dezembro de 1552, a mulher por trás de Martinho Lutero, o líder da Reforma Protestante. Ela entrou para a história como uma das poucas mulheres de sua época que vivia a vida que pensava ser certa para si, dentro das possibilidades da época, com pleno apoio de seu marido.

Pelo fato de ter sido freira, Catarina tinha tido a sorte de receber educação formal, algo impensado para mulheres de sua época, tendo aprendido a ler e escrever, também em latim, além de ter tido aulas de matemática, canto, cozinha, jardinagem, de cuidados com doentes e de ter aprendido as propriedades das ervas medicinais que plantava nos jardins do convento.

Dr. Martinho Lutero, ex-monge e professor de teologia da universidade de Wittenberg, líder da Reforma Protestante, via homens e mulheres como seres iguais perante a Deus, mas talvez por influência da época nem sempre ele achava, em geral, que mulheres e homens tinham o mesmo valor, apesar de ver em sua esposa a presença de Deus em sua vida e de frequentemente convidá-la para sentar-se ao lado dele nas reuniões que mantinha com outros reformistas do sexo masculino. Ele sugeriu que também meninas, além dos meninos, pudessem ir à escola para terem a capacidade de ler e formar sua própria opinião a respeito das coisas, mas chegou a afirmar que o homem era como o sol, com luz própria, e a mulher como a lua, iluminada pela luz do sol. Mesmo assim, ele primeiro a influenciou com seus escritos, afirmando que mulheres não precisavam viver como freiras para honrar a Deus, e que seriam salvas por meio da fé, quando ela decidiu fugir do convento junto de 11 outras freiras em 1523, e mais tarde, depois do casamento em 1525, proporcionou à Catarina, a partir de seus 26 anos, uma vida em liberdade, lhe dando os meios para que ela transformasse o local onde viviam em uma pensão e se ocupasse diariamente da criação dos muitos filhos, da administração de suas propriedades, da impressão e venda das ideias de seu marido Lutero e dos clientes da pensão, que chegavam a formar um grupo de 40 pessoas, para quem tinha que oferecer diariamente hospedagem e comida. O que tinha começado como um casamento arranjado e com grande diferença de idade (16 anos) entre um ex-monge e uma ex-freira, plenamente criticado pela sociedade em que viviam, acabou resultando em uma união estável com pontos positivos para ambos.

Entretanto, sua vida mudou completamente quando Martinho Lutero morreu, em 1546. Apesar dele ter deixado um testamento reconhecendo sua esposa como sua única herdeira e declarado que ela tinha plenos direitos sobre os filhos, fato que não era comum na época e contra o que ela enfrentou muitas dificuldades. Além do mais, teve que fugir de representantes da igreja católica e de ondas de doenças como a peste, tendo perdido suas propriedades e sido forçada a viver da ajuda de outras pessoas. Em uma dessas fugas, se envolveu em um acidente de charrete, que ela mesma guiava e que a levou à morte, seis anos depois de seu marido ter falecido. Ela morreu no ano de 1552, doente e praticamente empobrecida, em Torgau, na Alemanha.

Fontes: diversos artigos na Wikipedia do Brasil e da Alemanha, MDR, assim como diversos vídeos e documentários assistidos durante as comemorações de 500 Anos da Reforma.

::Re-nasce uma ativista – pelos direitos das mulheres, e pelo fim da cultura mundial do estupro::

14/06/2016

Desde meus tempos de universitária e aieseca não reconhecia um chamado tão claro quanto o de agora. Quanto mais leio e me informo, mais vejo que a situação da mulher no mundo ainda deixa muito a desejar. Ainda somos vítima de MUITA discriminação! Estamos ainda muitíssimo longe de existir de forma igualitária e de dividir a Terra de igual pra igual com os homens. Uma constatação triste, mas 100% verdadeira nos dias atuais, onde há casos de estupro sendo discutidos aos quatro ventos: a cultura do estupro é universal. No Brasil uma moça de 16 anos é estuprada por mais de 30 homens e estes só estão sendo julgados depois que uma delegada assumiu o caso; nos EUA uma moça foi estuprada dentro da universidade de Stanford, inconsciente, e o rapaz, reconhecido como estudante daquela universidade, bom nadador, leva pena leve de apenas seis meses (que poderia ter chegado a seis anos, por lei), porque, segundo o juiz, uma pena pior poderia ter consequências ruins para sua vida futura. Na Alemanha, a modelo Gina-Lisa Lohfink vai à Justiça contra dois estupradores, e de vítima passa a acusada, lutando no momento para não pagar uma multa de 24 mil euros por ter descrito que supõe ter sido dopada antes do estupro. O que aconteceu com ela foi em 2012, e há quatro (!) anos a fio um vídeo que os dois rapazes fizeram do estupro roda a internet e já foi clicado milhões de vezes, destruindo uma pessoa por dentro… E no Qatar uma holandesa foi estuprada, foi à Polícia e está presa no momento, pois no país o sexo é proibido antes do matrimônio… Quantas vezes mais veremos exemplos absurdos como estes???

GC

Portanto, estou buscando formas de agir em nome de minhas convicções. Re-nasce uma ativista, em idade adulta. Achei um grupo com o qual me identifiquei: Global Citizen. Se tiverem mais ideias de como podemos investir em causas atuais, agradeço pela sugestão.

Aqui o manifesto da Global Citizen traduzido agora para o português por mim:

Eu juro atuar contra leis que descriminem meninas e mulheres.

Muito poucas delas podem ir à escola ou têm acesso a um sistema de saúde, encontram um emprego que pague adequadamente ou têm direito a ser donas de terra. Eu me nego a aceitar esta desigualdade.

Uma em cada três mulheres sofrem violência durante suas vidas e milhões de meninas são casadas contra sua vontade. Mas isso não tem que ser assim.

Eu acredito em um mundo, no qual a metade da população não está submetida a leis sexistas e meninas têm a possibilidade de crescerem de forma saudável, podendo estudar e se tornar mulheres fortes.

Descriminação perante a lei é um dos maiores danos contra mulheres e meninas, pois o Estado não lhes oferece a proteção necessária. Em nome de uma igualdade de verdade não pode haver diferença entre homens e mulheres.

Mas leis não mudam sozinhas. Portanto temos que apoiar aqueles que lutam sem cessar por um mundo igualitário entre homens e mulheres, e temos que construir um movimento global. Eu declaro minha participação global ao Global Citizens e me coloco contra as leis que discriminam mulheres.

Vamos participar? Clique aqui.

::Sistema educacional na Alemanha::

22/07/2015

O sistema educacional alemão é pra lá de complicado. Basicamente, em termos de 1° e 2° graus, há três tipos de escola, a Hauptschule, a Realschule e o Gymnasium. Falando de forma bem simplória, na 4ª. série as crianças são avaliadas e recebem uma sugestão de que escola deveriam cursar a partir dali, o que de certa forma já define o caminho de sua vida, a princípio. Aqui no estado de Baden-Württemberg há poucos anos atrás a decisão era unilateral por parte da escola e se os pais eram contra essa decisão, a criança teria que fazer uma prova para poder estudar em outro tipo de escola que não o recomendado pelos educadores. Mas isso felizmente mudou e a decisão foi colocada nas mãos dos pais.

Crianças com notas mais baixas, principalmente em matemática e alemão, são indicadas para cursar a Hauptschule, crianças com notas médias irão para a Realschule, podendo depois se candidatar para cursos profissionalizantes, e as crianças no Gymnasium serão, em regra, aquelas que farão um curso universitário. Isso falando de forma bem generalizada, porque na prática pode acontecer, ainda que seja uma exceção, que uma criança acabe a Hauptschule, passe pra Realschule e chegue até o nível do Gymnasium, podendo então cursar uma universidade. A ideia básica deste tipo de ensino é dividir as turmas em grupos mais ou menos homogêneos e assim, também as expectativas do que essas crianças tenderão a ter mais tarde na vida adulta. O sistema está também apoiado nos pais, o que já foi comprovado através de várias pesquisas, mesmo sendo uma forma de preconceito, pois filhos de pais que cursaram uma universidade têm bem mais probabilidade de receber uma indicação para o ginásio do que um filho de operários.

As notas na Alemanha vão de 1 a 6, sendo que 1 é a melhor é 6 a pior. O engraçado é que não é necessário acertar a prova inteira para tirar uma nota 1. A partir de 93% das respostas corretas, a nota será 1. Às vezes o professor pode também oferecer testes extras que poderiam melhorar a nota final, e se a criança acertar tudo, as questões básicas e as extras, ela recebe um 1***,  portanto ultrapassa os 100%.  Pra complicar mais um pouquinho, a partir da Oberstufe do Gymnasium (que são os dois últimos anos do ginásio, anos 11/12) as notas vão de 15 a 0, sendo 15 a melhor nota e 0 a pior, claro. Aqui tem umas tabelinhas tentando explicar as notas na Alemanha.

Cada estado alemão decide independentemente sobre as notas dadas nas escolas, sendo que o que substitui o vestibular na Alemanha, a nota do Abitur de Baden-Württemberg e de Bayern (Baviera) são os mais respeitados no país. Existem também vários tipos de ginásio, humanistisches Gymnasium, Sport- und Skigymnasium, Musikgymnasium, Technisches Gymnasium und Wirtschaftsgymnasium (Oberstufe anos 11/13, ginásios especializados em ciências humanas, exatas, esporte, música, etc.), enquanto que o ginásio normal vai até os anos 11/12. Isso significa que quem chega ao nível do ginásio vindo de outro tipo de escola vai precisar de um ano a mais para chegar ao Abitur.  Também existe um Abendgymnasium, um ginásio à noite, geralmente para quem está  terminando o 2° grau para mais tarde poder estudar na universidade, geralmente adultos que trabalham durante o dia e estudam à noite.

Bem nova é a idéia da Gesamtschule ou Gemeinschaftsschule, que reúne os três tipos de escola em um só grupo, como no Brasil, até a classe 10. As aulas são o dia inteiro e as crianças não têm aula frontal o tempo todo, se acostumam a trabalhar em grupo, ajudar outros colegas e podem receber tratamento individual para se desenvolverem de acordo com suas habilidades. As notas são mais inteligíveis, pois o máximo é 100, e no fim do ano 10 as crianças podem continuar em um ginásio até atingirem o Abitur, se quiserem estudar em uma universidade na Alemanha.

Há dois tipos de universidade, a universidade normal, chamada Universität, e a Fachhochschule, uma universidade de ciências aplicadas, sendo mais prática do que o curso mais teórico de uma universidade normal. Quem tem o Abitur, pode estudar tanto em um tipo como no outro de universidade, mas quem só tem Fachhoschulreife só pode estudar na Fachhochschule.

A parte mais interessante desses mil e um caminhos é que as escolas alemãs são gratuitas desde a 1ª. série até o final do segundo grau. Na universidade se paga apenas um pequeno valor (tipo 60 euros) para efetuar a matrícula semestral. No estado onde moro, Baden-Württemberg, as crianças recebem todos os livros no início do ano letivo, tendo só que encapar os que forem novos e colocar o nome do aluno em uma listinha logo na contracapa de cada livro. Geralmente depois de alguns anos de uso consecutivo os livros são doados para os alunos daquele ano e livros novinhos em folha serão postos em circulação.

Na prática, claro, a vida não é tão simples como no papel. Já vi jovens deixando a universidade para tentar uma vaga em um curso profissionalizante, já vi muitos jovens terminando o Abitur e fazendo de tudo, menos universidade. No caso da turma da minha filha, que terminou o ginásio há um ano atrás e era um grupo de 130 pessoas, somente 10 foram estudar em seguida e a grande maioria foi viajar, fazer algum trabalho voluntário ou estágios que pudessem contribuir para eventualmente melhorar a nota do Abitur no processo seletivo para a universidade. Paradoxalmente, a Alemanha carece de profissionais de saúde, mas somente jovens cujo Abitur chega perto da nota 1 conseguem um lugar em uma universidade de Medicina, provavelmente a mais concorrida do país. Tem muito alemão indo estudar em países da Europa Oriental devido às dificuldades de conseguir um lugar em uma universidade alemã, o que não se aplica para todos os cursos.

O estado alemão tem soberania de definir os pilares da educação, as universidades têm soberania individual. O engraçado é que não há nada parecido como um ENEM ou um vestibular na Alemanha, e se o jovem tem interesse em estudar em 15 universidades diferentes, ele tem que se candidatar 15 vezes, e pode ser que cada universidade tenha pré-requisitos bem diferentes umas das outras. Como eu expliquei, a nota do Abitur vai decidir quem consegue uma vaga na universidade, mas há cursos, p.ex. na área criativia, que avaliam a aptidão do candidato além da nota através de trabalhos práticos, criativos, etc. Para cada caso, um caso, uma nova forma de tentar um lugar na universidade, novas regras.

Outros fatos curiosos: não existem uniformes. As crianças e jovens vão para escola como bem entenderem. Em geral celulares são proibidos dentro das escolas, que não têm nenhum muro ou tipo de controle na entrada. Durante o horário de funcionamento da escola entra e sai quem quiser. Se alguma criança é pega usando o celular, ela tem que entregá-lo ao professor e depois ir buscá-lo na secretaria… Não há chamada ou lista de presença, só na hora de entrega das notas de provas. O ano letivo começa em setembro e termina em julho (pode ser um pouco diferente de estado para estado, mas o ano letivo é sempre do meio de um ano até antes do final das férias do verão do ano seguinte).

Fui perguntada se acho que uma criança brasileira pode vir para a Alemanha e continuar os estudos aqui em uma escola alemã. Conheço crianças brasileiras e de várias outras nacionalidades que se mudaram pra cá e foram matriculadas em escolas normais da Alemanha, depois de um curso intensivo de alemão e de uma avaliação de que tipo de escola seria o mais adequado para elas. O mais importante mesmo é que a criança consiga receber uma boa base da língua alemã, para poder ter condições de acompanhar bem as aulas e de se enturmar na classe. As notas de alemão e de matemática são as mais importantes no currículo e ajudarão a decidir qual é o tipo de escola adequado para cada criança, mas se uma criança tem dificuldades de grafia e gramática, perderá notas em todas as outras matérias ao  fazer provas e cometer erros de alemão. Um fato interessante que li aqui e queria incluir neste post é que hoje em dia um terço dos estudantes na Alemanha tem pelo menos um pai de outro país, mas o número de estudantes filhos de imigrantes em ginásios é bem baixo. Na época da minha filha, praticamente só 5% tinham sobrenomes estrangeiros. Filhos de russos, judeus, chineses, coreanos ou vietnameses são matriculados com mais frequência no ginásio na Alemanha do que crianças alemãs, em termos percentuais.

A grande crítica ao sistema de ensino alemão é que na quarta série a vida de uma criança é definida em grande parte, e por outro lado o meio social dos pais influencia de forma considerável nesta decisão. A cultura alemã analisa o que falta, portanto uma criança tende a ser analisada pelo que lhe falta, não pelo que ela traz em abundância. Fico pensando o que é decidido no caso de crianças cujos pais não entendem bem o sistema ou mesmo o idioma alemão. Fico pensando o que teria sido de mim se tivesse crescido na Alemanha, se teria seguido a mesma trajetória que segui no Brasil. Todo ser humano deveria poder conseguir crescer tanto quanto sua potencialidade lhe permita e tentar transpor seus próprios limites.

E quanto a você, qual é a sua experiência com o sistema educacional alemão? Tem filhos que vão à escola aqui? Do que gosta, do que não gosta? Deixe seu comentário abaixo! Eu e os demais leitores agradecemos por sua contribuição!

::12 coisas que aprendi sendo mãe fora do Brasil::

06/04/2014

Acabo de achar a dica deste texto do blog “Tudo sobre minha mãe” no mural do Facebook da minha amiga Chris.

O texto é de autoria de Camila Furtado, uma mãe brasileira que também mora aqui na Alemanha. Li, gostei e compartilho com vocês. A frase da qual mais gostei foi a seguinte: “É necessário fazer muito ajuste mental para rodar a maternidade em um software gringo.” Isso é pura verdade. A Camila, como eu, vamos constatando isso cada vez mais, enquanto nossos filhos vão crescendo em território estrangeiro. Eu que o diga com filha adolescente! 😉

::Diversidade e inclusão: é normal ser diferente!::

18/04/2012

Há um tempo atrás fui numa palestra de uma pedagoga alemã incrível chamada Prof. Dr. Jutta Schöler, que discursou sobre a inclusão dentro de escolas alemãs.

34 escolas no país, dentre elas a escola do meu filho, estarão virando escolas de inclusão a partir do próximo ano letivo por decisão governamental e por obrigação também, porque a Alemanha assinou o artigo 24 da Convenção da ONU, que afirma o direito de educação inclusiva para crianças deficientes.

Mas acontece que a Alemanha ainda tem um sistema educacional muito divisor e por que não dizer segregador, onde muitas crianças (por mil e um motivos e às vezes até por nenhum motivo realmente existente) são retiradas das escolas normais e são colocadas em escolas especiais, chamadas aqui de “Sonderschule“. Em geral trata-se de crianças com algum tipo de deficiência ou uma combinação delas (visual / motora / audição, dificuldade emocional, de aprendizado, etc.), mas em alguns casos o problema é mais dos adultos do que das crianças. Estima-se que 60% das crianças alemãs tenha alguma deficiência no aprendizado(!), o que demonstra um certo desrespeito ao desenvolvimento individual. Enquanto que a Dra. Schöler acredita que somente 1/4 das crianças ditas deficientes sejam realmente deficientes! Ela notou muito bem que na maioria das vezes existe um problema com uma criança na escola principalmente quando dois adultos (no caso a professora/diretora e o pai/mãe) não se entendem. A Dra. Schöler afirma, e com muita razão, que “não devemos ver limites nas crianças, mas sim em nós adultos no que diz respeito à nossa capacidade de cooperação”. Ela mostrou através de vários exemplos que quanto maior for a deficiência da criança, maior será a necessidade dela de viver com outras crianças sem deficiência. Ela alerta para que uma criança não seja transferida a uma escola especial sem que os pais estejam de acordo com esta medida.

Levando-se também em consideração que a cultura alemã é a cultura da análise da falta (enxerga-se sempre o meio copo vazio e não o meio copo cheio), sempre haverá motivo de crítica e de expectativa com relação às crianças, ainda mais tratando-se de crianças estrangeiras ou mesmo alemãs, MAS filhas de estrangeiro(s). Escrevi “mas” com letras maiúsculas, porque para isso existe até um novo termo no vocabulário alemão: Menschen mit Migrationshintergrund (pessoas com passado migratório). Cabe a nós, pais, acompanhar nossos filhos e investir muito em carinho, elogios, observando aquilo que, dentro do nível de desenvolvimento do nosso filho, já melhorou e analisar o que mais pode ser feito para auxiliá-lo adequadamente. A sorte é que as terapias sugeridas (p.ex. fonoaudiólogo, ergoterapeuta, etc.) são todas pagas pelo seguro de saúde alemão através de guia médica expedida pelo pediatra da criança. O negócio é correr atrás! Em algumas cidades alemãs já é possível que os terapeutas visitem as escolas e ofereçam seus serviços em ambiente escolar, o que facilita a interação escola-aluno-terapeuta.

Na palestra aprendi um novo termo maravilhoso, que quero dividir com vocês e que aliás já faz parte do vocabulário norte-americano há muito tempo: inclusão x integração, termo último que é o ainda muito discutido aqui na Alemanha no momento. Mas qual é a diferença entre os dois termos?

A integração é a “teoria dos dois grupos” e parte do pressuposto de que a cultura vigente é superior às demais, e deve, no máximo, tolerar as demais culturas com quem convive. A inclusão, no entanto, parte do pressuposto de que todos são iguais com capacidades diferentes, que as as culturas são igualmente valiosas e nenhuma é maior ou mais importante do que a outra. Dentro desta linha de pensamento, é natural que cada indivíduo seja capaz de adicionar valor à comunidade e ao meio em que está inserido. Fantástico!

Ainda ontem a chanceler Angela Merkel se reuniu com representantes estrangeiros/filhos de estrangeiros de várias partes do país e estes por sua vez sugeriram que os meios de comunicação na Alemanha passem várias imagens de imigrantes, e não só a do ladrão, do corrupto, do malvado. A televisão deveria se esforçar para incluir em seus problemas mais pessoas de outras culturas, e os jornais/revistas deveriam noticiar também sobre bons exemplos de estrangeiros que deram certo no país e contribuem de forma positiva para a comunidade.

Minha prima Ciléia, que é interculturalista e faz um trabalho lindo nos EUA (St. Louis) promovendo a cultura latino-americana, passou-me um entrevista muito valiosa hoje da qual tirei o seguinte:

“Diversity without inclusion is like adding a few drops of vinegar to oil and calling it a great dressing. How can new people be expected to fit into old models and drive new value? The power of diversity shines in a culture of inclusion, where differences are valued and encouraged. Common values are the foundation, but different perspectives and behaviors lead to new understanding, ideas and growth”.
Erby L. Foster Jr. Diretor de Diversidade e Inclusão da The Clorox Company

Aqui a tradução: Diversidade sem inclusão é como jogar uns poucos pingos de vinagre no azeite e chamar a mistura de “molho excelente”. Como pode-se esperar que novas pessoas caibam em estruturas pré-existentes e adicionem valor a elas? A força da diversidade aparece através da cultura da inclusão, onde diferenças são reconhecidas e encorajadas. Os valores comuns são a fundação, mas perspectivas e comportamentos diferentes levam a novos entendimentos, ideias e crescimento.

Alguns links muito interessantes:
– Uma biblioteca de pedagogia inclusiva, na qual constam vários textos, dentre eles muitos da pedagoga Jutta Schöler.
– A íntegra da palestra de Jutta Schöler na minha cidade está aqui (clique em “Vortrag: Inklusion in der Schule”).
Campanha da ONG Caritas Kein Mensch ist Perfekt (Nenhum ser humano é perfeito).

::O que é melhor na Alemanha?::

09/02/2011

Segundo o Dago e Cintia, leitores do livro da Mineirinha: cerveja, muros mais como objetos de decoração, a educação no trânsito, as poucas sacolas de plástico e os ônibus. Leia uma descrição muito bem humorada sobre algumas diferenças culturais entre o Brasil e a Alemanha aqui. Chamo a atenção para a observação muito válida de que aqui seguem-se as leis por ter-se medo (reserva pessoal) de transgredi-las, enquanto que no Brasil tendemos a gostar de transgredir as leis pelo gosto de um desafio. Note-se que esse gosto é trazido por todo brasileiro pra cá!

Detalhe: só o “header” (a figura no alto do blog) do site deles e as fotos lindas da filhota Anabella já valem a visita por lá! E se tiverem ficado curioso(a)s, leiam mais sobre o super projeto atual do Dago, para o qual ele aceita apoio de terceiros!

::Mundinho pequeno::

29/11/2008

Tirei do blog Uhull:

Se pudéssemos reduzir a população do mundo a um vilarejo de 100 pessoas, mantendo todas as proporções atuais, o resultado seria o seguinte:

57 asiáticos
21 europeus
14 do hemisfério ocidental (Américas)
8 africanos

52 mulheres
48 homens

70 não-brancos (amarelos, vermelhos ou negros)
30 brancos

70 não-católicos
30 católicos

59% de toda a riqueza seria de 6 pessoas, e todas as 6 seriam dos Estados Unidos
41% da riqueza seria distribuída por 94 pessoas

80 morariam em casas abaixo do desejável
20 morariam em casas boas e ótimas

70 seriam analfabetos
30 alfabetizados

50 seriam desnutridos
50 nutridos

1 (sim, só um) teria nível superior
99 não teriam nível superior

1 teria um computador
99 não teriam computador

Quando se considera o mundo de uma perspectiva tão comprimida a necessidade de aceitação, compreensão e educação se torna absurdamente aparente, não?


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