Ela se levanta e vai cuidar da vida. Antes, dá uma enroladinha de 5 minutos na cama. Em pouco tempo, depois de pular da cama, ela e o filho estão prontos para o novo dia. Dependuram bolsas, mochilas e tudo o mais que precisam em seus corpos e dão no pé para não perderem o ônibus. Já dentro dele, dão o primeiro “bom dia” do dia para o motorista, conversam um pouco, se ajudam com o que levam, trocam umas ideias sobre o dia e sobre o que está por vir e se despedem a certa altura, quando o filho desce do ônibus.
Ela segue na rotina diária de dar uma lida nas manchetes dos jornais, e constata a cada vez mais como os jornais sofrem com esse mundo digitalizado! Muitas vezes, as manchetes não refletem mais os últimos acontecimentos… Ela agradece em carreira pelo transporte público que a leva até o trabalho, mas inicia uma cadeia de reclamações quando algo sai fora do planejado e as expectativas de chegar no trabalho em determinado horário vão pro espaço.
Um pouco de Facebook, mais leitura. Ah sim, agora as mulheres podem dirigir na Arábia Saudita?!? Quer dizer, a partir do meio do ano que vem??? Ah, e elas iam tirar carteira em outros países, se por ventura achassem quem as liberasse para tal, e agora estão felizes que vão poder tirar suas carteiras do esconderijo? Nossa, elas não podiam ir a um estádio e agora podem fazer parte das festividades nacionais??? Elas não podiam tanta coisa, quer dizer, não podem ainda, isso tudo tem que ser organizado ainda. Vão ter que abrir mais auto-escolas, preparar o país para uma mudança grande dessas… Ah, e tudo isso depois de um clérigo ter anunciado lá “que as mulheres não merecem dirigir porque só têm um quarto do cérebro de um homem!” Ah sim, com certeza esse rei que anunciou essas novidades tão “bondoso” não está sendo movido a dinheiro, obrigado a modernizar o país 100% dependente do petróleo, e os homens não estão cansados de ficar dirigindo as mulheres para cima e para baixo e pagar motoristas para elas, que bem poderiam estar dirigindo seus próprios carros e movimentando a economia com as próprias pernas!… Money makes the world go round!… Muito bem.
Ela chega no trabalho e o dia passa, como sempre, voando… Se não prestar atenção, nem um café ela toma, porque já chegou a hora do almoço. Ah, perdeu o horário de ir almoçar com os colegas por causa de outro compromisso. Não faz mal, ela resolve comprar algo pra comer e vai pra beirada do rio, aproveitar o sol e as árvores de mil cores do outono. Encontra por acaso um jovem de 20 e poucos anos, colega de trabalho dela, e diz pra ele aproveitar a vida como estudante de Mestrado, que ele vai começar no começo do ano que vem. “Estudantes vivem definitivamente uns dos melhores anos de suas vidas! “, diz ela… Não comenta que se refere às preocupações do dia a dia do adulto, às decepções que a vida vai apresentando, às correrias, às expectativas de tudo e todos que nem sempre podem ser cumpridas… Money makes the world go round!… Muito bem.
Já tinha a firme intenção de voltar para casa quando é pega, antes de conseguir se levantar da cadeira, por uma das pessoas importantes com quem ela lida. Ele reclama e descarrega sua frustração enquanto ela procura opções e argumenta. Ele se vai… e ela descobre que por 5 minutos perdeu o trem e terá que ficar mais meia hora no trabalho até que chegue o próximo trem…. Vai acabar chegando em casa à noite…. Money makes the world go round!… Muito bem.
No caminho pra casa, umas florzinhas lindas no caminho, um passo firme para ter certeza de que vai chegar na hora que o trem vai passar, um pouco de WhatsApp, algumas mensagens, umas novidades do Facebook… e mais notícias do dia. E esse tal de Weinstein sobre quem todos estão escrevendo nas manchetes das revistas, quem é ele? Ah… que cara nojento, esse chefão e magnata da Miramax, uma das 100 pessoas mais influentes do mundo, usando seu poder para comer as menininhas e mulheres de Hollywood, ameaçando destruir as carreiras delas e ao mesmo tempo saindo do banheiro pelado pronto “pr’aquilo” sem querer nem saber se a pessoa está interessada ou não… Casado e com mulher em casa, mas quem importa com isso? “Ah, e não tem problema nenhum, se alguém ousar abrir a boca, eu dou uma desculpa esfarrapada e ofereço uma grana para que ela fique calada! ” (Parêntesis para as vezes que eu mesma sofri ataques mínimos e não tão mínimos de homens nos ônibus, no primeiro emprego, do chefe, do colega de trabalho, do namoradinho… Fiz por bem esquecer da maioria deles, mas quando começo a ler as descrições detalhadas de algumas das mulheres atacadas pelo Weinstein, as lembranças colocadas no cantinho da memória afloram…) Money makes the world go round!… Muito bem. Mas, pensa ela, há algo positivo nessa meleca toda: as mulheres estão tomando coragem de denunciar o que é antes sofriam caladas!
Ela olha pra fora no trem e vê um céu indescritivelmente lindo! Vermelho, alaranjado, todo pintado, parece até pintura! Ela tira o celular da bolsa pra fotograr aquele espetáculo! Ao invés de ir direto para a casa, ela vai na direção da água para tirar mais fotos, observar o pôr do sol, lindo de um jeito diferente a cada segundo que passa. Que momento mágico! Há muito, muito a agradecer. E muita beleza que muitos não têm tempo de ver, mas que ela agradece por ter a oportunidade e realmente presenciar aquilo, poder estar PRESENTE. A vida é um presente.
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